Ensino Religioso: prós e contras

Há tempos que o tema ensino religioso ocupa as pautas de movimentos que militam por ele ou contrariamente a ele. Em tempos de polarizações acirradas, quando os grupos reincidem em discursos enrijecidos e bem pouco abertos ao exercício de escuta do outro, também no que tange à disucssão sobre ensino religioso, os posicionamentos seguem um tanto polarizados: de um lado, os laicistas, do outro, os professores de ensino religioso e simpáticos a esse componente curricular. 

Acho que vale lembrar aqui, novamente, que a discussão aberta sobre esse tema poderia ser bem mais produtiva se houvesse do lado dos laicistas, a admissão de que não se estuda "contra o ensino religioso" - como recentemente ouvi uma pesquisadora da UERJ falar num vídeo que divulgava as contribuições legadas pelo II CONACIR e V Semana de Ciência da Religião da UFJF - simplesmente, porque isso não é tema de pesquisa. Mas, sim, pode-se estudar os efeitos de práticas de ensino religioso confessionais e proselitistas que contrariam as prescrições da Constituição e da LDB. Pode-se, sim, por meio desses estudos ressaltar como o ensino religioso pode ser instrumentalizado em favor de práticas discriminatórias, da invisibilização das religiões afro-brasileiras e da intolerância religiosa. 

Com estudos nesse sentido, pode-se sim, a partir deles, questionar a legitimidade de tal ensino religioso, do qual, eu, sou a primeira a colocar-me contra. Contudo, não é um procedimento científico adequado, a partir de uma realidade específica, propor generalizações. O caso do "ensino religioso no Rio de Janeiro" não representa a realidade do ensino religioso em todo o território nacional. Logo tecer considerações sobre a ilegitimidade do ensino religioso com base em dados relativos a apenas uma realidade histórica e social específica é construir generalizações vazias, posto que os argumentos são elaborados a partir de um leque restrito de informações que, nem de longe, refletem toda a complexidade geográfica e cultural brasileira e, do ensino religioso nesses diversos contextos.

Aqueles que estudam o ensino religioso no Brasil, de modo geral, admitem que essa disciplina - agora componente curricular - foi domínio da Igreja Católica durante séculos, motivo pelo qual tornou-se espécie de curral religioso católico. Esse dado, entretanto, ao longo das últimas três décadas tem se transformado. Já não se pode dizer do ensino religioso que é catequese católica, pois par e passo com o enfraquecimento dessa instituição em termos de adesão da população brasileira, também nas escolas, o perfil discente (e docente) tem mudado. Há mais evangélicos, há mais candomblecistas, espíritas e outros religiosos, nem sempre identificados, que nos (e dos) espaços escolares impelem-nos a pensar a presença do fato religioso nas escolas.

Assim, uma pesquisa mais legítima, ao meu ver, expandiria suas estacas para além do eixo Rio-São Paulo (que não é definitivamente onde tudo acontece) para a análise de outros casos e situações em que o ensino religio, pasmem, não é confessional e ou proselitista, mas fenomenológico (compreensivo) e antropológico (analítico-descritivo). Aí, sim, poderíamos inferir, a partir de mais dados, mais evidências, mais conhecimentos sobre a situação do ensino religioso no Brasil. 

Lidar com o ensino religioso hoje, não tem ligação com se você gosta ou não, se concorda ou não. Lidar com o ensino religioso hoje, tem ligação com o "como" fazê-lo em conformidade com a LDB e "o quê" ensinar no âmbito desse componente curricular (discussão essa em andamento por meio do debate público a respeito da BNCC, em que figura o ensino religioso). 

Nesse sentido, um outro ponto relevante desse dabate é o que diz respeito à formação de quadros docentes para o ensino religioso. Formação que qualifique docentes ao ponto de prepará-los para lidar com as questões religiosas dentro dos espaços escolares não como freiras, padres, pastores ou babalorixás; mas, como professores e professoras, educadores e educadoras, isto é, pessoas habilitadas a falar sobre religião, suas narrativas históricas e míticas, seus sistemas de crenças, suas práticas rituais e seus costumes. Vale dizer, profissionais que não são obrigados a conhecer todas as religiões do mundo, mas que estão preparados para buscar os caminhos que podem conduzir educandos e educandas a conhecê-las.  Esse é o tipo de ensino religioso reflexivo que contribuirá efetivamente para a construção de uma sociedade em que o respeito pelas alteridades - por mais radicais que sejam - torne-se um princípio inegociável. 

Para finalizar, porque aposto na formação de professores como meio de consolidar um ensino religioso reflexivo e laico, proponho a leitura de um artigo que publiquei recentemente. 

Críticas e sugestões são sempre bem-vindas!

https://ufjf-br.academia.edu/ElisaRodrigues/Papers

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